O Baptismo na Água (XVII)

cmo.jpg     Então que quis ele dizer quando afirmou: "para que ninguém diga que fostes baptizados em meu nome"?

     Poderá um leitor sério sugerir porventura que Paulo, quando baptizava uma pessoa, dizia "Eu te baptizo no nome de Paulo?", ou que algum Coríntio diria que Paulo o fez? Quem acreditaria nisso? Deixemos que sejam as Escrituras a explicarem-se!
 
     Para podermos compreender, convém lembrar aqui que as palavras "em nome de", ao contrário do que quase todo o mundo dos crentes supõe, não era uma fórmula. Sempre que o rito do baptismo hodierno é levado a cabo, ouve-se constantemente esta frase como uma fórmula, "Eu te baptizo em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo" (Mat. 28.19). Puro erro. Os apóstolos não foram instruídos a repetir estas palavras, mas simplesmente a baptizarem em nome de, isto é, por autoridade de o Deus trino, precisamente da mesma forma que um agente da polícia pode prender um criminoso em nome da lei sem ter que o fazer invocando "a fórmula". Ele não pronuncia necessariamente "em nome da lei", numa tal situação. Pelo contrário, anuncia que está a fazer cumprir a lei que lhe conferiu autoridade para aprisionar. Da mesma forma o nosso embaixador na ONU pode falar em nome de Portugal, sem que para o fazer tenha que preceder cada sua intervenção com a "fórmula", "Eu, em nome de Portugal ..." — seria ridículo, pois todos os presentes sabem que ele recebeu autoridade de Portugal para falar ou actuar. O que está em questão não é a repetição das palavras, mas a autoridade do representante. O que o Senhor disse aos onze foi que lhes dava autoridade para baptizar. Baptizar era uma tremenda responsabilidade, pois era "para perdão dos pecados". Para tal era, pois, precisa autoridade Divina. Os crentes de Actos 2.38 foram baptizados "em nome de Pedro", isto é, por autoridade de Pedro — Pedro tinha autoridade Divina para baptizar. Ora os poucos crentes em Corinto que foram baptizados por Paulo, foram-no, mas não "em seu nome", isto é, não por sua autoridade — Paulo não tinha recebido autoridade para baptizar —, "porque Cristo enviou-me, não para baptizar". Se o fez, foi simplesmente porque emergiu duma dispensação em que isso era norma. Os que acham que as palavras "em nome de" são uma fórmula requerida para este ritual, ficam perplexos e baralhados quando lêem em Act. 2.38 e 19.5 que os crentes ali não foram baptizados "em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo", mas simplesmente "no nome do Senhor Jesus". Se fosse a repetição de palavras que estivesse em causa, como é que temos aqui uma alteração nelas? Não, o que estava em causa, repetimos, não era a repetição das palavras, mas a autoridade do representante.

     Neste presente século de graça, com tantos séculos já passados desde que a nação de Israel foi finalmente posta de parte, que diremos dos que continuam com este rito da dispensação precedente? Não estarão a baptizar em seus próprios nomes?

     A fim de compreendermos a razão de Paulo ter baptizado, não nos podemos esquecer que ele foi salvo durante a administração Pentecostal do Evangelho do Reino, e que Ananias foi enviado a ele com a mensagem que era apresentada a qualquer Judeu naquela época, "Levanta-te, baptiza-te, e lava os teus pecados, invocando o nome do Senhor" (Act. 22.16). Paulo, depois disto, labutou 8 ou 9 anos entre o povo de Israel onde este baptismo era praticado. Pedro tinha sido enviado ao Gentio Cornélio e baptizou-o. (Não eram simplesmente os sacerdotes que tinham que ser lavados, ou baptizados, no Velho Testamento. Os considerados cerimonialmente imundos também, que fala dos Gentios, e explica o baptismo dos Gentios sob a "Grande Comissão"). Foi desta situação dispensacional que Paulo emergiu para a nova dispensação que Deus lhe confiou. Esta emergência não foi repentina. Não houve um corte completo, duma vez por todas, com tudo o que estava para deixar de estar em vigor. Tratou-se duma transição gradual que cobriu um período de 20 a 30 anos. As Escrituras revelam muito claramente que a nação de Israel não foi posta de parte instantaneamente, pois Paulo fala tanto da "queda" como da "diminuição" de Israel (Rom. 11.12). Israel foi diminuindo até ao fim dos Actos, enquanto o programa da dispensação da graça foi sendo introduzido progressivamente. Cristo foi "derribando (progressivamente; não derribou instantaneamente) a parede de separação que estava no meio" (Efé. 2.14). O muro do velho programa não caiu repentinamente. Foi caindo tijolo a tijolo. Os sinais foram postos de parte com o povo dos sinais quando o pronuncio de juízo final sobre eles foi feito em Act. 28.28. Convém aqui lembrar que assim como a circuncisão era um sinal do concerto Abrâmico, o baptismo na água era um sinal do concerto Davídico, pois como já vimos, o baptismo na água nas Escrituras, está associado com a manifestação de nosso Senhor como Rei de Israel (João 1.31).

     Ora, foi durante este período transicional que Paulo teve ainda liberdade entre os Judeus para praticar aquelas coisas que estavam ainda em vigor. Cristo tinha enviado os doze a baptizar tanto os Judeus como os Gentios, e assim, Paulo, emergindo dessa dispensação, também baptizou alguns Judeus e Gentios, apesar de Cristo nunca o ter comissionado a fazê-lo. O Senhor entretanto ia dando sucessivas e progressivas revelações a Paulo (Ver Act. 26.16; II Cor. 12.1) a respeito da nova ordem de coisas que, a pouco e pouco, se ia estabelecendo, e é nesse interim que ele toma conhecimento da omissão do baptismo na água da sua comissão e da verdade do "um só baptismo" de Efé. 4.5 — o baptismo do Espírito. Na altura em que ele escreveu a I Coríntios teve certamente conhecimento destes factos tão plena e claramente que podia "dar graças a Deus" por ter baptizado poucos crentes.

     Em resumo: João Baptista foi enviado a baptizar? Sim, e temos Escritura para isso. Os onze (ou doze) foram enviados a baptizar? Sim, e temos Escritura para isso. Paulo foi enviado a baptizar? Não, e temos Escritura para isso! De facto temos tanto evidências negativas como positivas de que o Senhor glorificado não enviou Paulo a baptizar, que o baptismo não fazia parte da sua comissão.

     Muitos crentes dizem que Mat. 28.19,20 são as últimas instruções de Cristo, mas estão completamente enganados, pois, mais tarde o Senhor falou de novo, do Céu, e enviou Paulo a evangelizar, mas não a baptizar.

     Quem quiser tentar dar a volta a I Cor. 1.17 que nos faculte uma só passagem das Escrituras que declare, ou claramente implique, que o baptismo na água era parte da comissão que Deus deu a Paulo.

     Agora pensemos com cuidado: João Baptista e Pedro teriam obedecido à comissão que Deus lhes deu se eles tivessem baptizado apenas poucos, e ainda dissessem que estavam gratos por isso? Certamente que não, pois eles foram mandados a irem pregar e baptizar, e com os seus ouvintes o baptismo na água, juntamente com o arrependimento e a fé, era uma questão de vida ou de morte, como acontecia com as ofertas de animais segundo Lev. 17.11 e Heb. 9 22.

     As palavras de Paulo em I Cor. 1.14-18 devem ser consideradas à luz do facto de que Deus usou Paulo para introduzir uma nova dispensação como ele declara em Efé. 3.1-4 (Ler bem).

     Ainda sobre o facto de Paulo ter baptizado alguns, não nos esqueçamos que semelhantemente ele também falou línguas, curou os enfermos, expulsou demónios e circuncidou Timóteo. Será que devemos praticar tudo isso? Não, pois isso pertence tudo à dispensação anterior, da qual ele emergiu gradualmente. Nós podemos ver algo disto na própria passagem que estamos a considerar.

     Primeiro ele diz (I Cor. 1.14,15): "Dou graças a Deus porque a NENHUM de vós baptizei, SENÃO a Crispo e a Gaio. Para que ninguém diga que fostes baptizados em meu nome". Notemos bem: Nenhum, senão estes dois.

     Depois, no Ver. 16 ele acrescenta, "E baptizei também a família de Estéfanas". Isto agora é diferente! Primeiro ele diz dois e não mais, e depois acrescenta uma família inteira. E isto não é tudo, pois agora, tornando-se mais cauteloso, diz, "além destes, não sei se baptizei algum outro" (Ver. 16).

     Isto soa estranhamente contrário à inspiração Divina, não soa? O apóstolo parece inseguro de si. Ah, mas nós encontramos aqui a maravilha da Inspiração das Escrituras, pois a Bíblia, a Palavra de Deus escrita, como Cristo a Palavra viva, é completamente humana e completamente Divina. Paulo escreveu naturalmente como homem aos seus amigos, não estando certo quanto ao número exacto dos que ele teria baptizado, mas isto é também Deus a falar e a demonstrar-nos que o baptismo na água tinha perdido a sua importância.

     Porque é que Paulo estava alegre de ter baptizado apenas poucos, e porque é que não estava certo do número? Descobrimos a resposta clara no versículo seguinte. Leiamo-lo cuidadosamente e meditemos nele.

     "Porque Cristo enviou-me, não para baptizar, mas para evangelizar ..." (Ver. 17).

     E acrescenta:

     "NÃO EM SABEDORIA DE PALAVRAS, PARA QUE A CRUZ DE CRISTO SE NÃO FAÇA VÃ;

     "PORQUE A PALAVRA DA CRUZ É LOUCURA PARA OS QUE PERECEM; MAS PARA NÓS QUE SOMOS SALVOS, É O PODER DE DEUS" (Vers. 17,18).

     É por isto que o baptismo na água caducou. Quando Israel rejeitou o Rei e o Seu reino, e tudo estava pronto para receber a ira de Deus na Grande Tribulação, Deus, em admirável amor e graça, interrompeu o programa profético, salvando o Seu principal inimigo na terra, Saulo de Tarso, e enviou-o como o arauto e a demonstração viva da Sua graça ilimitada, usando-o para introduzir a dispensação sob a qual vivemos agora, "a dispensação da graça de Deus" (Efé. 3.2).

     O leitor já notou quantos crentes podem citar I Cor. 1.18, mas quão poucos citam os Versículos 17 e 18 juntos? Eles fazem parte um do outro, pois assim como o "porque" do ver. 17 nos envia para os versículos precedentes, o "porque do ver. 18 envia-nos para o ver. 17:

     "Porque Cristo enviou-me, não para baptizar, mas para pregar o Evangelho, não em sabedoria de palavras, PARA QUE A CRUZ DE CRISTO SE NÃO FAÇA VÃ;

     "PORQUE A PALAVRA DA CRUZ é loucura para os que perecem; mas para nós que somos salvos, É O PODER DE DEUS".

     Isto não indica que "o evangelho da graça de Deus" de Paulo se baseia no portentoso feito de Cristo no Calvário? O apóstolo não queria que nada, nem um rito religioso nem a "sabedoria de palavras", depreciasse esta mensagem, pois é na proclamação da cruz que jaz a salvação. Porquê? Porque a cruz declara a justiça de Deus (como também o Seu amor) ao ostentar o pagamento da justa condenação dos nossos pecados. Isto é apresentado maravilhosamente em Rom. 1.16,17, onde o apóstolo declara:

     "Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê ...

     "PORQUE NELE SE DESCOBRE A JUSTIÇA DE DEUS ..."

     O amor de Deus também foi revelado no evangelho, e por isto o apóstolo estava profundamente grato, mas o que fazia dele tão orgulhoso do evangelho era o facto de que a justiça de Deus estava revelada nele. Ele não ia para os perdidos e dizia,"Arrependei-vos e cada um de vós seja baptizado para o perdão dos pecados". Dizia antes, "Tenho notícias maravilhosas para vós. Os vossos pecados foram todos expiados! Crede no Senhor Jesus Cristo e sereis salvos". Isto é na verdade graça! Não admira ele escrever aos Gálatas:

     "Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo ..." (Gál. 6.14).

     Ele podia gloriar-se nos feitos do Calvário. Ele podia gloriar-se — e nós também — no facto de Deus ter tratado justamente com os nossos pecados; que a salvação se baseia num fundamento sólido de uma pena cumprida, de tal modo que ninguém no céu poderá dizer a alguém, "O quê! Tu aqui?" Pelo contrário, regozijar-nos-emos todos juntos no bendito Salvador que pagou a condenação plena de todos os nossos pecados.

     Paulo deu graças a Deus por duas coisas, durante essa altura: "Dou graças a Deus porque a nenhum de vós baptizei ..." (I Cor. 1.14) e "Dou graças ao meu Deus porque falo mais línguas do que todos vós" (I Cor. 14.18). A maioria dos pregadores ortodoxos, hoje, dá graças a Deus pelo número elevado de crentes que baptizam e condenam como heréticos os que não praticam o baptismo; e dão graças a Deus por não falarem línguas e condenam como fanáticos os que "o fazem". Alguém com um mínimo de arrazoabilidade verá facilmente a contradição disto.

     A palavra "lavar" em I Cor. 6.11 — " ... Haveis sido lavados ... pelo Espírito" —, no Grego, é exactamente a mesma que foi traduzida também por "lavar" em Actos 22.16, e são as únicas vezes que ocorrem. Quando Paulo foi salvo, como já vimos, o baptismo era requerido para a lavagem dos pecados, porém mais tarde escreveu aos Coríntios, "haveis sido lavados pelo Espírito". Como é possível ser-se tão cego a ponto de não se ver uma tão clarividente mudança dispensacional como esta? Ah, como oramos intensamente para que o Senhor ilumine os olhos do seu entendimento, querido leitor!

 
(Continua)
Carlos Oliveira

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