Atos Dispensacionalmente Considerados - CAPÍTULO XLVIII – Atos 28:1-16 (3)
A MORDIDA DA VÍBORA E A GRAÇA DE DEUS
É altamente significativo que uma víbora tenha surgido do fogo para atacar Paulo, assim como a nação de Israel estar prestes a ser posta de lado nos propósitos de Deus.
O facto de os governantes de Israel, e especialmente os Fariseus, naquele tempo, serem considerados víboras aos olhos de Deus, é evidente no registo inspirado. Três vezes no Evangelho segundo Mateus, vemo-los serem chamados de víboras.
Em primeiro lugar, João Batista, detetando a sua hipocrisia ao virem ao seu batismo, repreende-os com as palavras:
“E, VENDO ELE MUITOS DOS FARISEUS E DOS SADUCEUS QUE VINHAM AO SEU BATISMO, DIZIA-LHES: RAÇA DE VÍBORAS, QUEM VOS ENSINOU A FUGIR DA IRA FUTURA?
“PRODUZI, POIS, FRUTOS DIGNOS DE ARREPENDIMENTO” (Mt 3:7, 8).
Em segundo lugar, o nosso próprio Senhor, depois de eles terem blasfemado d’Ele, mostrou porque eles não poderiam dar bom fruto, dizendo-lhes:
“RAÇA DE VÍBORAS, COMO PODEIS VÓS DIZER BOAS COISAS, SENDO MAUS? POIS DO QUE HÁ EM ABUNDÂNCIA NO CORAÇÃO, DISSO FALA A BOCA” (Mat. 12:34).
Em terceiro lugar, depois de pronunciar ai após ai sobre eles, Ele diz-lhes:
“ASSIM, VÓS MESMOS TESTIFICAIS QUE SOIS FILHOS DOS QUE MATARAM OS PROFETAS.
“ENCHEI VÓS, POIS, A MEDIDA DE VOSSOS PAIS.
“SERPENTES, RAÇA DE VÍBORAS! COMO ESCAPAREIS DA CONDENAÇÃO DO INFERNO?” (Mat. 23:31-33).
Mesmo após a ressurreição e ascensão de nosso Senhor, os principais de Israel continuaram a sua implacável oposição contra Ele. Eles ameaçaram os Seus apóstolos, flagelaram-nos e lançaram-nos na prisão. E quando Estevão ousou dizer: “Vós sempre resistis contra o Espírito Santo”, eles arrastaram-no para fora, apedrejaram-no até à morte e empreenderam “uma grande perseguição” contra os santos em Jerusalém (Atos 7:51,58,59; 8:1).
No entanto, tudo isto não indica que a sua amarga campanha contra o Messias estava a ter sucesso. Pelo contrário, eles perderam round após round do combate e nunca chegaram a estabelecer um plano consistente de ataque. Enquanto os apóstolos seguiam um curso que era retilíneo como uma flecha, os principais tentaram primeiro isto e depois aquilo, apenas para serem derrotados e envergonhados repetidas vezes.
Pedro responde aos membros do Sinédrio com tal poder espiritual que os seus acusadores foram transformados em réus e antes de ele e João deixarem a sala do Supremo Tribunal de Israel, eles informam-nos que pretendiam continuar a pregar a Cristo (Atos 4:5-21). Quando os apóstolos são presos novamente (em maior número desta vez) um anjo liberta-os, e quando o Sinédrio faz uma convocação e ordena que sejam trazidos da prisão para julgamento, descobrem que eles estão a pregar no templo, permanecendo um mistério o modo como eles terão escapado da prisão. E novamente os apóstolos declaram que continuarão a pregar a Cristo (Atos 5:17-32). Então Gamaliel aconselha os governantes a deixá-los (5:38), mas isso ainda se mostra menos eficaz, pois agora lemos que "... todos os dias no templo e nas casas, eles não cessavam de ensinar, e de anunciar a Jesus Cristo” (5:42).
E quanto ao apedrejamento de Estevão e à perseguição que se seguiu, Deus contragolpeou com o maior golpe de todos: a conversão de Saulo,[1] que lhes roubou o seu líder mais destacado e agressivo. Nesta derrota dolorosa, encontramos os principais metidos de novo nas suas tocas - e por um tempo considerável. As igrejas descansam “em toda a Judeia, e Galileia e Samaria” e multiplicam-se constantemente (At 9:31).
Os apóstolos e presbíteros de Jerusalém realizam o seu próprio conselho em liberdade, desafiando o Sinédrio, com uma grande multidão de longe e de perto (Atos 15). E passado pouco tempo há “muitas dezenas de milhar[2] de Judeus” em Jerusalém “que creem” (Atos 21:20) e os principais nada podem fazer a este respeito. Como Simão, o judeu apóstata de Samaria, eles estão “em fel de amargura”.
Entretanto, Paulo fora enviado “aos Gentios de longe”, para oferecer-lhes salvação e bênção à parte de Israel, pela graça de Deus e com base na morte de Cristo. Através do seu ministério, milhares de Gentios passaram a regozijar-se no Deus de Israel e no Messias que Israel havia rejeitado.
Isto era demais para os principais suportar e, quando Paulo visitou Jerusalém novamente, eles saltaram do fogo, por assim dizer, para atacá-lo e destruí-lo.
“Tira da terra a um tal homem!”, gritaram eles, “porque não convém que viva.” E na sua ira eles clamaram, “arrojando de si os vestidos, e lançando pó para o ar” (Atos 22:22,23).
Era por causa da sua inimizade que Paulo estava agora acorrentado, que havia sofrido este terrível naufrágio e em breve seria chamado a comparecer perante Nero. Mas neste breve incidente simbólico, o Espírito Santo mostra quão fútil é a raiva dos principais, e quão inevitável é a sua morte, pois o apóstolo simplesmente sacudiu a bicha para o fogo, continuando ileso.
O nosso Senhor havia alertado estes principais que, se eles blasfemassem contra o Espírito Santo, eles nunca poderiam encontrar perdão, nem naquele século, nem no século futuro (Veja Mat. 12:31,32). Eles agora haviam persistentemente blasfemado contra o Espírito Santo quando Cristo foi apregoado pelos apóstolos “pelo Espírito Santo enviado do Céu”. Assim, eles seriam entregues ao fogo do juízo de Deus, enquanto Paulo continuava a dispensar à Igreja e ao mundo ainda maiores riquezas de graça.
[1] Embora ele fosse jovem demais e sincero demais para ser incluído na categoria das víboras a que os principais pertenciam.
[2] Esta é a tradução correta.
Atos dispensacionalmente Considerados
Cornelius R. Stam